REVELAR A MEMÓRIA A PARTIR

DO ESQUECIMENTO

(2ª SÉRIE)

Bem-vindos à minha segunda exposição como autor ‘BOBA KANA MUTHU WZELA – REVELAR A MEMÓRIA A PARTIR DO ESQUECIMENTO – 2ª SÉRIE’, que nos revela esse enorme quilombo da poderosa Lisboa do século XVIII, o Mocambo. Um território de línguas proibidas.

Esta pequena exposição resultado de um trabalho autoral no campo da fotografia de grande formato e ao estilo cinematográfico, onde tentei retratar o esquecimento e a memória da silenciosa presença dos negros em Portugal, sem omitir o tema maldito da escravatura, e o racismo entranhado no subconsciente.

Portugal, que chegou a África há precisamente 600 anos (Ceuta), num conjunto de feitos gloriosos que levaram a possuir um enorme território, numa empresa que terminou há 40 anos. Mas, como consequência desta primeira globalização, a maior migração intercontinental de sempre, onde mais de 7 milhões de pessoas foram arrancada às suas famílias nos territórios ultramarinos, maioritáriamente os “Minas” e os “Angolas”, forçados a uma viajem sem retorno, que contribuiu para a edificação desse poderosíssimo império, que deu à humanidade um homem novo.

Nesta 2ª série, podemos descobrir os muros e os longos trilhos, fora de muralhas na Lisboa do século XVIII, um ‘mocambo’ não edificado, mas também os retratos da nobreza e dos escravos retratados no quadro “5 de Fevereiro”, que nos desvenda um acontecimento estranho passado numa esquadra da policia às portas de Lisboa, no início deste ano. BOBA KANA MTHU WZELA, revela-nos também nas palavras desconhecidas a urgência do grito “Liberdade Já!”,  e os princípios éticos da República, e os valores dos mais velhos da Luta de Libertação, que alguns novos aristocratas capitalistas, donos dos territórios e dos povos, das leis e das liberdades, decidiram silenciar. Mas, como escreveu Agostinho Neto, “...à frescura da mulemba, às  nossas tradições, aos ritmos e às fogueiras, havemos de voltar...”

Está também presente nesta exposição o quadro, o quinto neto da rainha Ginga. (1º série), que foi apresentado nesta Galeria no ano passado.  Por fim, uma pequena homenagem ao poeta desta casa, que fez ontem, 250 anos. Também ele um poeta maldito, que usou sem reprovação as palavras mais vergonhosas.

Agradeço à cidade de Setúbal a cedência deste espaço, em particular ao Bruno Ferro, do Arquivo Fotográfico Américo Ribeiro instalado nesta casa.

Quero reconhecer também, a todos os Amigos que de uma forma generosa participaram na construção destas imagens, bem como às instituições que abriram as suas portas sem qualquer contrapartida, como o Palácio Nacional de Mafra e o Palácio do Machadinho.

Mas quero contar-vos um segredo: este ano descobri uma jóia, um pequenino ‘mocambo’ às portas de Lisboa, o surpreendente Bairro da Cova da Moura, que convido a visitarem (podem marcar visitas acompanhadas).  Nele, o meu profundo agradecimento à Associação Cultural Moinho da Juventude que agarrou sem preconceitos este projecto autoral. Um reconhecimento especial à Godelieve Meersschaert, ao Flávio Almada (LBC), da direcção do Moinho, autor do texto sobre a presença dos negros em Portugal, que será brevemente editado no livro do quadro “5 de Fevereiro”, bem como ao Celso Lopes, autor do vídeo sobre o “5 de Fevereiro de 2015”,  ao Grupo Kola San Jon, a todos...

Para terminar, quero dedicar esta exposição ao Eduardo Pontes (1936–2015). O Eduardo nasceu nos Açores, foi detido pela PIDE juntamente com o seu irmão António, e encarcerado em Ponta Delgada, seguiu sob prisão para o Aljube, em Lisboa.  No bairro da Cova da Moura, foi o 1º Presidente da Associação Cultural Moinho da Juventude, projecto comunitário criado em 1984. Em 2007, o Moinho da Juventude foi galardoado pela Assembleia da República com o Prémio Direitos Humanos.


Com ele diria: “Djunta mo”

JRicardo Rodrigues

(Setúbal, 16 de Setembro de 2015)

‘Sekulo’ [2017]

Apresentação da peça “Sekulo” na véspera do 4 de Fevereiro, às 18:30H, no Espaço Santa Clara, 160, em Lisboa (junto à Feira da Ladra).

Projecto 'revelar a memória a partir do esquecimento'.